Eu vinha planeando escrever uma novela oitocentista em que as personagens se comportavam como presunçosas insuportáveis e tudo era enfatuado e falso. Romance acontece; novela desenrola-se. A história seria publicada em episódios e começaria num rígido colégio para raparigas de onde sairiam a ladina Elisabete, inteligente mas deserdada da vida, e a boazinha mas enjoativa Amélia, em casa de quem a primeira se empregaria como governanta. Elisabete tentaria um casamento com o irmão gordo de Amélia, José, comerciante nas Índias Orientais, mas veria a sua estratégia fracassar com a intervenção do irmão magro e canalha da amiga, o tenente Jorge (nem todos os magros são canalhas, mas os canalhas são quase todos magros). A partir daí era tudo colina abaixo. Ok, não adianta esconder, já todos perceberam que o enredo era baseado na história da minha vida. Pelo menos a parte da colina abaixo. Então descobri que um tal William Makepeace Thackeray (um nome obviamente falso, nada a ver com os Thackeray do Fundão) roubara a minha ideia. Ele foi ao ponto de chamar à sua novela “Feira das Vaidades”. Eu planeara dar-lhe o nome “Feira do Relógio”. Admito que, pelo menos nesse capítulo, ele esteve melhor do que eu. Informei-me sobre o indivíduo e descobri que se fazia passar também por cartoonista. Dá para acreditar?
Perturbado, fiz o teste de Turing, mas felizmente deu negativo.