29.6.10

Uma carta a Queiroz

Um tipo chamado Phil Woosnam, antigo jogador e treinador galês hoje naturalizado americano porque não se conseguia lembrar de como se dizia “futebol” em inglês, sintetizou na perfeição a filosofia do jogo. Ele dizia que “se a bola se mexe, devemos dar-lhe um pontapé; se não se mexe, devemos pontapeá-la até que se mexa”.

Não sei dar ao professor Queiroz, muita honra como vai o prazer é todo meu guardarei este momento para sempre no meu coração, maior ajuda do que isso que leu nesse parágrafo aí em cima. Conto que seja suficiente para, mais logo, bater a selecção adversária. A cuja é a Espanha, lembrei-me agora mesmo.

Allez les bleus!
ou lá o que é que se diz nestas ocasiões, eu estarei torcendo uma vuvuzela por vocês.

25.6.10

Das festas

Ando tão babado por a minha filha ter passado no exame de condução que Sete Rios vai finalmente justificar o nome que tem. Arreceio-me até de, com a emoção, dar alguma informação errada, mas aqui vai.

Em primeiro lugar, não esquecer que Brasil e Portugal jogam às 17:53 na África do Sul (hora local, em Portugal continental serão 17:30). O meu prognóstico para o jogo, construído a partir da análise científica de todos os dados disponíveis, do lançamento de búzios e de uma pergunta que fiz da varanda a um transeunte, é empate sem golos. Em segundo lugar, lembre-se de que Eugénio Oneguine vai passar pelo São Carlos às oito. É uma boa oportunidade para, finalmente, assistir ali a uma ópera em que se percebe tudo o que os intérpretes dizem. Last but not least, se perdeu Brel nos Açores ontem, ainda está a tempo de o ver, hoje e amanhã, no Jardim de Inverno do S. Luiz. Não vá, não, e daqui por trinta anos, quando lhe perguntarem “Lembras-te daquela coisa extraordinária do Nuno Costa Santos e tal”, vai corar muito e dizer que está com a memória fraquinha e ninguém vai acreditar porque seria praticamente impossível ter-se esquecido.

18.5.10

Desfazendo mitos

Não é verdade que o Canal Parlamento tenha sido criado para que os outros canais pudessem parecer interessantes.

17.5.10

Mínimas

Se não quer que toda a gente olhe para si no restaurante, evite sentar-se sob o televisor.

30.4.10

Escrevem “Retrato de um jovem”

como se, sem essa informação, fôssemos incapazes de perceber que o retratado não é propriamente um idoso.

7.4.10

Mínimas

As cidades são os bolsos para onde os países atiram tudo e mais alguma coisa.

2.3.10

O terceiro diagnóstico

Eu já podia celebrar o milésimo aniversário da primeira vez que disse isto, eu sei, mas não sou homem para efemérides. Ontem, porém, deixei-me tocar pelas imagens de um monte de gente escalando a estátua do Marquês de Pombal e acometendo os cimentos da Avenida dos Aliados para comemorar o dia que Chopin festejava como sendo o do seu aniversário. E porque nunca desperdiço uma oportunidade para fazer que sou erudito, lembrarei, para desfrute do leitor assim mais dado a citações, um excerto de uma carta que o tísico franco-polaco escreveu a um amigo parisiense a partir do seu triste idílio em Maiorca (eia, um oximoro, viu? – eu avisei que não desperdiçava uma oportunidade). Reza assim:

“Três médicos vieram ver-me. O primeiro disse que eu ia morrer. O segundo, que eu estava a morrer. O terceiro, que eu estava morto.”

Hoje, médico algum hesita em concordar com o terceiro diagnóstico – mas também é certo que a Medicina está muito mais avançada.

9.1.10

99% de literassia, temos a gente

Calhou-me ontem usar a caixa Multibanco da estação de serviço de Torres Vedras para ver se conseguia transferir dinheiro da conta de alguém muito rico para a minha. Não foi possível, provavelmente o sistema estava em baixo, acontece-me sempre isso. Do lado esquerdo do teclado, um autocolante prevenia os incautos:

ATM protegido
As notas serão inutilizadas em caso de abertura indevida.

Imaginei o meliante, imerso no seu indispensável barrete encardido, no acto de acorrentar a caixa à Ford Transit roubada; a cuja, traseira meio enfiada no lado ilegal da montra estilhaçada, aguardaria em delicado ponto de embraiagem a conclusão da tarefa. Então um colega de bando, notando o autocolante, interromperia a intervenção urbanística:

“Lamento, mas este ATM está protegido, old sport. As notas serão inutilizadas em caso de abertura indevida. Que sorte madrasta.”

E os assaltantes abandonariam cabisbaixamente o objecto da sua cupidez, após o que procurariam uma mercearia que a essa hora ainda estivesse aberta e rapinariam o recheio da caixa registadora. Frugal, na melhor das hipóteses, mas decerto não adulterável, ainda que em caso de abertura indevida.

31.12.09

Da conversão da Rússia

Em criança, eu pensava que a Rússia dos czares era uma nação atrasada porque aquilo a que chamamos “Revolução de Outubro” acontecera em Novembro. Sei agora que a décalage se deve a questões religiosas com não despiciendas consequências geórgicas, mas desde então tenho muita atenção com isso das datas. Jamais dou parabéns atempados a aniversariantes e nunca celebro uma efeméride sem antes proceder a uma investigação escrupulosa que, em regra, me toma vários anos e consome variadíssimos subsídios.

Compreenderá o benquisto leitor, tendo em conta o que acima escrevi, que me atrase um pouco nos desejos de felizes seja o que for, mas este ano abrirei excepção e gritarei à janela (fechada se a temperatura baixar dos oito graus),

Um 2010 supimpa para todos os leitores do BV!
Já o não-leitor do BV terá de esperar que eu conclua as minhas indagações e publique a monografia, mas previno-o desde já que a coisa está preta: tudo indica que hoje são, não 31 de Dezembro de 2009, mas 4 de Setembro de 1990, o que faz do dia de amanhã, quanta coincidência!, o do meu 27º aniversário. Estarei aceitando parabéns e lembranças entre as três e meia da tarde e as oito, após o que tentarei explicar aos meus filhos que, não tendo eles nascido ainda, inexiste qualquer justificação para alimentação, quanto mais para prendas e mesadas, as cujas exigirei de volta. Serei magnânimo, porém: não terei em conta, nem a inflação, nem compensações devidas por eventual estado de sucata dos objectos devolvidos.

14.12.09

Anarquia

Um Rei Republicano fez um Golpe de Estado contra Si Mesmo e derrubou a Monarquia Absoluta; o Povo, agradecido, nomeou-o Presidente Vitalício. No dia da Tomada de Posse, porém, Conspiradores Monárquicos lançaram um Contra-Golpe e restauraram-no no Trono da Nação. O Povo, reconhecido, pediu ao Rei que mandasse decapitar o Cabecilha da Rebelião Republicana. Sua Majestade graciosamente acedeu ao desejo do Povo, instalando-se então uma Anarquia.